02 – Oliveira do Bairro

:: 27/9/2014 (sábado) – 21h15
Bar do Quartel das Artes

  “Religião e Política”
   • Carlos Abreu Amorim
   • José Manuel Pureza
:: 20/9/2014 (sábado) – 14h30
Salão paroquial
  “Razões de (des)crença”

:: 26/9/2014 (sexta-feira) – 11h
Auditório da Escola Secundária
  “Educação, Ciência e Religião”


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Crer ou não crer: quando a religião e a política se cruzam em franco diálogo

Um diálogo franco, em que cada um, independentemente da sua cor política, da sua crença religiosa ou qualquer outro interesse divergente, “diga de facto aquilo que pensa”. É assim, despido de preconceitos, que cada cidadão convidado para o projeto “Palavras no tempo” se apresenta. No sábado, dia 27 de setembro, na Cafetaria do Quartel das Artes, Carlos Abreu Amorim (vice-presidente do grupo parlamentar do PSD) e José Manuel Pureza (ex-líder parlamentar do Bloco de Esquerda) deixaram (ou pelo menos tentaram deixar) à porta as suas ideologias político-partidárias e falaram sobre religião: acreditar ou não em Deus foi a questão.
Crença e não crença resume o cerne desta conferência, uma das três acolhidas no concelho de Oliveira do Bairro no âmbito do projeto Palavras no Tempo, que tem a parceria da Câmara Municipal e do Agrupamento de Escolas de Oliveira do Bairro. Um projeto ali representado e apresentado por João Paiva e Aniceto Carmo e que tem a sua génese na obra “Educação, Ciência e Religião” (Gradiva, 2010), da autoria de Alfredo Dinis (1952-2013) e João Paiva, um padre jesuíta e um leigo crente.
José Manuel Pureza representava naquele diálogo a crença. Carlos Amorim, a não crença. Ali estavam ambos, “única e exclusivamente numa lógica de cidadania”, começou desde logo por vincar Carlos Amorim. E clarificou que “a relação com a religião é intrinsecamente individual”.
Carlos Amorim encara o mundo “de uma forma dessacralizada”. “Rejeito a ideia de uma intervenção divina, sobrenatural, metafísica ou mágica.” Disse partilhar uma ideia de desencantamento do mundo, mas garantiu não o fazer “com uma arrogância intelectual, muito pelo contrário, pois a posição que vê o mundo desta forma é muito menos confortável”. Afirmou, sem rodeios: “não consigo ter fé, não tenho, não sou capaz”. Mas, frisou, “respeito inteiramente os que a têm, desde que a crença dos outros não interfira na minha liberdade de não ter”.
Já José Manuel Pureza, em resposta a Carlos Amorim, disse simplesmente: “eu não consigo deixar de ter fé”. E, acrescentou, “digo isto sem nenhuma ironia”. Carlos Amorim clama-se ateu. “Não sou agnóstico, que é também uma posição confortável e até egoísta em relação ao «problema». Na altura de se casar, “precisei de um papel da minha paróquia para me ir casar à paróquia da minha futura esposa e lá, o padre descreveu-me como «católico em busca».” “E sou casado, e bem casado, até hoje, graças a Deus”, brincou.

Disponibilidade para algo

Católico em busca, ripostou José M. Pureza, “é alguém que, situando-se no mundo, pergunta por que há algo e não o vazio. Essa busca é uma atitude de disponibilidade para” algo. Deixou para reflexão que “atitudes religiosas há muitas” e que a “atitude religiosa é de preenchimento de um vazio”.
“Ser católico também não me traz conforto, tal como para o Carlos Amorim não lhe traz não o ser”, disse Pureza.
Contextualizando a religião numa História que começou há milénios atrás, Carlos Amorim salientou que “todos nós fazemos parte deste todo civilizacional”. “Para o bem e para o mal, somos todos cristãos, enquanto participantes nesta lógica, e particularmente nesta cultura portuguesa, que é inegável, do catolicismo.”
Apegando-se um pouco à sua capa política, não teve dúvidas de que “o decisório político tem de estar imbuído desse mesmo espírito” e que, “enquanto político, tenho de perceber que componente religiosa é fulcral para percebermos aquilo que as pessoas são”.
Na opinião de José M. Pureza, há três desafios imprescindíveis para uma atitude sensata. “Primeiro, o grande ganho da modernidade é o primado da consciência. É em cada um de nós que se tomam as decisões. Envolve a recusa de qualquer tipo de fanatismo religioso. Segundo, o primado do pluralismo. Aceitar as virtualidades do pluralismo, como um bem. Terceiro, o primado do mundo. É em cada um dos mais pequeninos que se realiza o projeto de Deus. Falar de Deus não faz nenhum sentido se não tiver como referência o impacto dessa coisa nos mais pequeninos através de mim.”

Público interessado

Os rumos da História, acreditar ou não em milagres, como é que um casal em que um é crente e o outro não cria os seus filhos, a esquerda será não religiosa e a direita religiosa/crente; as guerras religiosas, foram questões colocadas por alguns dos cerca de 80 cidadãos presentes aos convidados, que a todas responderam, sem tabus.
Dentro da lógica da crença política, o bloquista disse nunca ter sentido qualquer “problema de natureza pessoal com as minhas posições de natureza crente relativamente às minhas posições enquanto militante do meu partido”. “Pelo contrário, senti mais vez dificuldades em acolher a minha posição dentro da igreja católica do que dentro do partido onde sou militante”. E terminou dizendo que “ter fé, ser cristão não é ser obediente a um catálogo de regras”.
Carlos Amorim acredita que “a fé é a resposta a todas as dúvidas, é cómoda, é doce, é o aconchego de todas as inquietações. Já a dúvida, é a maior inimiga da fé”.
E deixou uma mensagem: “um dos homens mais vis que conheci um dia disse-me isto – um santo peca sete vezes ao dia, o que é preciso é que se arrependa”.
O projeto “Palavras no tempo” vai continuar, sendo o próximo a 17 de outubro, em Ovar. A ideia é patrocinada pela editora Gradiva, sendo parceiros o Centro Nacional de Cultura e a Universidade do Porto. No final de 2015 será publicado pela Gradiva o livro “Palavras no tempo”, que sintetiza o essencial das exposições/debates desenvolvidos. O incentivo à leitura, aliás, como insubstituível veículo de promoção cultural, está sempre presente com a disponibilização dos livros dos conferencistas convidados ou por si recomendados, a propósito de cada tema.

Oriana Pataco

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