Um estudo que dá resposta a muitas questões sobre a evolução das aves tem assinatura de vários investigadores portugueses. O trabalho de âmbito internacional contou com o envolvimento de centenas de cientistas de 20 países a nível mundial. Oito de um total de 23 artigos são hoje publicados numa edição especial da revista "Science".
Após quatro anos de investigação e através da análise e sequenciação completa do genoma de 48 espécies de aves, entre as quais, o corvo, o pato, a águia e o periquito, os cientistas descobriram que o período de maior expansão das aves deu-se há 66 milhões de anos a propósito da extinção dos dinossauros. Desta forma, as aves tiraram partido do "vazio" deixado por estes animais e deu-se um surto muito rápido de formação de novas espécies, numa "explosão" evolutiva.
O trabalho agora publicado desvenda muitas questões que há anos confundiam os cientistas e apresenta uma árvore genealógica mais completa e fiável das aves. O estudo revela ainda que, em comparação com outros grupos, apresentam um genoma muito compacto e que têm menos sequências repetitivas de ADN. Verificou-se também que faltavam genes e que muitos deles se tinham perdido ou inativado.
"Apesar de se terem perdido genes não houve uma deterioração da capacidade destes animais, antes pelo contrário deram origem a espécies diferentes", esclarece ao Ciência 2.0 Agostinho Antunes, líder do grupo de nove investigadores do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR) envolvidos neste trabalho. Estas conclusões permitiram desvendar, por exemplo, por que é que as aves perderam os seus dentes e como se adaptaram para obter um esqueleto mais leve.
Descobertas sobre o desenvolvimento do olfato nas aves e a adaptação ao voo
Foi precisamente neste ponto do estudo que se debruçou a equipa do CIIMAR. "Dentro dos genes que estudámos, envolvidos com a parte da ossificação, verificou-se que cerca de 50% estavam sobre pressão seletiva, ou seja, uma pressão para terem mutações que lhes alterassem uma funcionalidade", detalha. João Paulo Machado, investigador que integra este grupo, explica também ao Ciência 2.0 que "as aves desenvolveram ossos pneumáticos, sendo uma característica que as habilita e adapta ao voo".
O olfato e os detetores olfativos, os cromossomas sexuais das aves, a visão a cores, as penas coloridas, entre outros, são muitos dos aspetos sobre estes animais que a investigação aborda, numa comparação com mamíferos e répteis. O conjunto de estudos revela ainda que o desenvolvimento do olfato nas aves está relacionado com a adaptação aos diferentes nichos ecológicos que encontraram e ao tipo de alimentação, havendo diferenças entre as aves predadoras e as aquáticas.
Para obter estes resultados os cientistas tiveram de utilizar tecnologia de sequenciação de DNA genómico e ferramentas computacionais de última geração. Rute Fonseca, também investigadora portuguesa, a trabalhar em Copenhaga, desenvolveu neste campo uma ferramenta bioinformática que deteta problemas resultantes da anotação automática de genomas.
Agostinho Antunes salienta que é vontade da equipa internacional de investigadores continuar o estudo, analisando e sequenciando o genoma de um maior número de espécies.
A investigação fez parte do "Avian Phylogenomics Consortium" que envolve mais de 200 cientistas provenientes de 80 instituições e tem como líderes Guojie Zhang do Banco Nacional de Genes (BGI) na China, Erich D. Jarvis, da Universidade de Duke nos Estados Unidos da América, e M. Thomas P. Gilbert do Museu de História Natural da Dinamarca.
Foto: flickr/Kai Bey