Sexo: Algo carnal; expressão máxima do instinto corporal.
Sexo: Confirmação de uma ligação emocional entre indivíduos.
Algures entre uma visão mais fria ou mais romântica, há um conjunto de variáveis biológicas, psicológicas e socioculturais que determinam o desejo sexual.
Ele pode ser mais ou menos frequente, mais ou menos intenso. Cada pessoa tem o seu perfil de desejo sexual, e quando este causa incómodo ou insatisfação estamos perante um problema. “A maior parte das vezes, não há uma disfunção mas sim uma dificuldade, uma diminuição de desejo por alguma circunstância da vida.”, esclarece Ana Alexandra Carvalheira, presidente da Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica.
A disfunção do desejo mais comum é desejo sexual hipoactivo – a diminuição ou ausência total de desejo, motivação e interesse sexual. “Aparecem-nos casais jovens (com 30/35 anos) com pouca atividade sexual porque realmente, hoje em dia, o nosso dia a dia é anti-erótico”, destaca, ao Ciência 2.0, Francisco Allen Gomes, especialista em Psiquiatria com um vasto trabalho na área da Sexologia Clínica.
De facto, o desejo sexual humano não é uma simples pulsão fisiológica, como a fome ou a sede ou como funciona nos animais. Para além das questões biológicas, a vertente psicológica e a sociocultural completam o triângulo de determinantes da vontade de ter sexo.
O que o corpo determina
Começando por um dos vértices, refira-se que a parte biológica do desejo é muito complexa e está ainda por esclarecer totalmente. Sabe-se que “para haver uma excitação sexual, tem de haver uma parte cerebral que faça uma apreciação do estímulo e considere se esse é ou não um estímulo positivo, depois é ativada uma área motivacional, há uma resposta endócrina [hormonal] [ver glossário], uma resposta do sistema nervoso autónomo [ver glossário], e, finalmente uma resposta emocional”.
Durante este processo “são ativadas no cérebro áreas favoráveis ao desejo (na zona hipotalâmica [ver glossário]) assim como suprimidas outras áreas que habitualmente inibem o desejo (áreas mais ligadas, por exemplo ao córtex cerebral [ver glossário])”.
Quando falamos em hormonas envolvidas na ativação do desejo, há que destacar a testosterona, fundamental tanto em homens como em mulheres. E, nas mulheres, também o estrogénio, que atua ao nível da atração sexual e recetividade. Do ponto de vista neuronal, a transmissão dos estímulos nervosos relacionados com o desejo depende dos chamados neurotransmissores. Nomeadamente dos mecanismos de dopamina, que exerce um efeito estimulante nos centros sexuais do cérebro, e serotonina, que exerce um efeito contrário, ou seja, inibidor.
Dando ainda atenção ao corpo, refira-se que o nível de desejo pode então ser alterado, por exemplo, pela toma de determinados medicamentos. Alguns antidepressivos são um exemplo de substância que influencia negativamente a dinâmica dos mecanismos da serotonina e da dopamina podendo levar a uma diminuição da vontade sexual. Da mesma forma, também a própria depressão é responsável por uma diminuição do desejo a nível central.
Outros medicamentos ou problemas de saúde (diabetes, hipertensão, excesso de gorduras no sangue,entre outros) que afectem a irrigação sanguínea ou a condução nervosa podem também ser motivo de uma diminuição de desejo. No homem diminuem a resposta eretiva e na mulher afetam a circulação à volta da vagina e por isso a capacidade desta responder aos estímulos.
“A perspetiva biológica é sempre reducionista”
“Se a pessoa está inserida numa sociedade que não permite a expressão sexual, o seu cérebro vai ser mais sensível a mecanismos de inibição do que a mecanismo de excitação”, esclarece Francisco Allen Gomes. A forma como cada indivíduo foi educado e socializado para a sua sexualidade vai ser uma forte influência.
Completando o triângulo que metaforicamente construímos para explicar os determinantes do desejo sexual, atentemos nas questões psicológicas e emocionais. Estados de stress, ansiedade, tristeza ou cansaço influenciam negativamente a predisposição sexual.
No caso da existência de uma relação entre os parceiros sexuais, e desta ser já de uma longa duração, é normal que o casal passe uma “deserotização”. “É fundamental não perder o erotismo, a surpresa, a criatividade”, destaca Ana Carvalheira.
Ainda do ponto de vista psicológico, é importante que “a pessoa se sinta bem com o seu corpo”. A presidente da Sociedade Portuguesa de Sexualidade Clínica revela que este problema afeta principalmente as mulheres. Muitas “vivem completamente desligadas do corpo” e têm dificuldade para o prazer em geral com as sensações físicas. “Não interpretam os sinais do seu corpo. Muitas das vezes têm uma resposta física de excitação sexual mas não há correspondência a nível subjetivo”, explica.
De facto, as mulheres necessitam de uma grande harmonia entre os três vértices (biológico, psicológico e sociocultural), para terem vontade sexual, mas a dependência de todas as variáveis aqui descritas é comum aos dois sexos, e, por isso, também os homens sofrem de problemas de falta de desejo.
Atualmente, vivemos um “período de transformações sociais na forma de encarar o sexo. Até há duas décadas a socialização sexual das mulheres era muito mais repressiva. Hoje em dia caminhamos para uma vivência mais livre do prazer nos dois sexos,” avança Ana Carvalheira. A especialista destaca ainda que quem tem problemas neste campo procura também mais ajuda médica, até porque “há mais informação disponível, e existem já várias consultas públicas de sexologia no país”.
Glossário:
Zona hipotalâmica (Hipotálamo) - Zona do cérebro, cujos núcleos regulam várias funções vegetativas, nomeadamente a temperatura do corpo, o sono, e diversos processos relacionados com o metabolismo.
Sistema nervoso autónomo - Sistema nervoso que regula as funções e atividade involuntária e inconsciente de alguns órgãos internos.
Resposta endócrina (do sistema endócrino) - Agente regulador de toda a atividade do organismo que atua através de mensageiros químicos libertados para o sangue como o sistema de glândulas endócrinas, que se baseia na secreção de hormonas.
Córtex cerebral - Porção superficial do cérebro constituída por substância cinzenta. Distinguem-se seis camadas de neurónios sobrepostos que definem diferentes áreas especializadas em funções muito específicas.
Foto: Flickr/NeoGaboX
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